segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Perdido de Raiva Terceira e última pedrada

Terceira pedrada
(Já sem força)

1.
Deponho as armas.

Erejo estátuas ao herói de ultra-mim.
Perdi a guerra e o corpo porque lutei,
Mas tu és livre, independente.
Não te faças ex-colónia!

2.
Deixo-te rastos visíveis,
Socalcos que te dirijam,
Veredas delimitadas.
Não há que errar caminho.

Bifurca-se a estrada, bem sei,
Mas segue como tu queiras
Que a minha estadia é um pêndulo.
Entre as vias que tomares
Algures te encontrarei.

Só tens que seguir em frente.

3.
Após muito escrever
Respiro fundo,
Tombo a cabeça no ombro
-o meu-
E deixo-me adormecer.
Estou limpo.
Incólume.
Renasço
Esquecido de outonos
E assiamesado com os dias.

Sou sol se assim fôr
Ou chuva se assim idem.
Abandono os poemas.

[Sei bem
Que em rasgos violentos
De incapacidade timoneira
O leme foge das mãos
E uns versos acontecem
Em toalhetes de papel,
Guardanapo ou coisa tal.

Mas são vãos.]

4.
Uma pausa,
Um suspírio de desalívio
-Tenho os dedos prenhes-
E vou para a conversa.

Ainda bem
Está aqui o Paulo
-Pereira-
E tem Migueis
-d´Angelos-
E outros cromos
-de cromáticos-
Sobre quem falar.

Assim acontecem pinturas;
Pigmentos pululam no diálogo,
Diluentes e colas
-ou outro nome que nem lhes sei
ou não me lembro-.
O que quer que seja.
Tudo! Tudo
Menos o Álvaro de Campos
Ou José Régio.
Tudo menos o Sá Carneiro.

Mas não se pode...

Alma
de negrumes
de-negrida
de-negreiros.
Castigos láticos.
Agora páro:
-Láticos? Que raio é isso?!...
Látegos, sim devem ser látegos.
Ando esquecido,
Ando longe de mim e da minha língua;
Ando perdido...
de raiva...

E quero falar de Rembrandt,
Do Noiret (que é Thomé)
E até daquele pintor
Que nome tem e não o tem.

Falo das cores,
Falo das formas,
-falo de ti-
E sobre as mesclas que escorrem
Cromáticas
Sobre os versos
Com que me espancas.
Perdão, espantas!

Um brandy e uma lata.
E o Paulo
Que sabe mais do que eu
E assim o mostra,
Fala-me de misturas que se diluem,
De tintas que se apaixonam
E desvanecem.
E de telas
-quem dera tê-las-
E flores.

Agora esquivo;
Finta de corpo
Que há anos o basquete me cravou
E passo a bola.

Flores não
Que têm espinhos!

Paulo não sabe disso.
Por certo colhe flores
Em prados e não nas urbes.

Enfim, o dia esbate-se nas telas,
As luzes acendem-se nas janelas,
Os poemas cerram portas
E uma amêndoa amarga fecha o dia.

Adeus, pessoal.
Quadro findo.

5.
Tenho que encerrar este livro.
Decepar os olhos que te viram,
Incendiar os troncos derrubados
E soprar cinzas ao vento.

Definir definitivamente o tom,
A cor, o traço e a geometria;
Cravar pináculos no tecto
E abarrocar o estilo.

Tenho que terminar
As capelas imperfeitas.

Cercam-me cordas manuelinas,
Flamejantes telhados
Os que me cobrem;
Abóbadas ecoam os meus passos
Neste convento que não convence.

De joelhos imploro:
-Um carinho, por quem sois!

Na fileira de estátuas
Que criam as memórias,
Todas elas muito puras,
Mármore alvo, alvíssimo,
Mas gélidas, frias de amor,
Nem um afago, sequer um gesto!

Tenho que encerrar este livro!

6.
Caramba,
Vou aos tombos pelas rimas abaixo
Embalado por uma super bock
Na espera que telefones...

Não consigo encerrar o livro!

Há poemas do Filipe (o Daniel)
Que quero cantar contigo.
(Ensinas-me?)

A chuva tolheu-me os passos.
Um novo convite à super confunde-me.
-Telefonaras tu ao menos-
Vou beber. Vou ficar
À espera que a chuva passe.
Fico.

Estou a sentir-me ébrio
E bebo para o sentir
Porque sei que tu não gostas.
Faço-me-te mal. Porquê?
Se ao menos telefonasses...

Dou a dentada no tremoço,
Sorvo-lhe o sal e sei teu corpo:
Húmido, macio, apetitoso...

Não.
Definitivamente
Com uma super e um pires de tais tremoços
Não encerrarei o livro!


7.
Amo-te.

E agora o descalabro.
O porquê que não tem porque.

Amo-te.

E choro.

Puta que pariu tal amor!


8.
Se o álcool me matasse
Decerto estaria eu morto.
Agora. Agora! Não ontem
Nem amanhã. Agora!

O álcool não assassina
Apenas estupidifica.

-Por isso falas de amor?
Porque estupidificaste?

E bebo um longo, looooooongo trago.
(Mas não trago nada,
só es...)

9.
Como raio consegues tu
Vir falar nos meus poemas?

Cala-te! Cala-te de vez!
Ou sê de vez o meu poema.


10.
Estou triste,
Dás-me um beijito?

Não dás, não dás, não dás.

Eu imploro com raiva
E tu chamas-me agressivo.

Porra, dá-me um beijito!

10 a.
Dá-me um beijito azul
Do tipo lápis doutrora.

Obriga-me a calar, ternura;
Asfixia-me o paleio;
Estrangula-me os dedos!

Tolhe-me o corpo, tolhe!
Tolhe!, se não eu fujo.

11.
Tomba a gota no caderno.
É lágrima de cera.
Pousa nela o verso quente
E lacro (ou lacrimo)
De vez o livro.

(Encerrado a seis – dia dos reis)

1 comentário:

  1. Agradeço à minha pequena amiga Rosa Melo a pachorra com que vem aqui corrigir as gralhas. Continua que assim ainda hás-de vir a ser grande. :)

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